Certas vezes escrevo para ver concretamente o que não pode ser dito. Seja o que for, isto sempre pode ser escrito. Mesmo à sombra da perseguição ou patrulha moral, surge na página o vil, o medonho, o sádico, o pornográfico, o fornicador e todo indistinto conteúdo do dentro. Algo tão grande que impele as linhas e tão modesto que sucumbe à moral popular, tecido morto…
Não há moral na tinta da página. Nada além de tinta flutuando em branco. Aqui sodomizo a moral sem que ela possa ao menos apoiar-se em seus quatro cascos. Aqui tomo todas as formas que quiser. Tenho chifres e com asas de anjo lhe encanto para disfarçar o coito, o prazer, o gozo. Eu defeco e ainda assim regozijo, todos regozijamos, como colegiais diante do impudico, se pudesse, colocaria o cheiro pujante dos banheiros, dos quartos usados e da genitália cansada, da hipocrisia de uma sociedade decaída e caquética. Como se não bastasse, assino quem eu quiser porventura ser, imaginário, real, sem definições, apenas humano.
A culpa é para os homens e um escritor humano só deveria escrever livros de auto-ajuda. Deixem a literatura para os demônicos e os devassos, para os insanos, para os que não querem agradar, apenas derramar sentimentos pungentes. Se na hora do traço, esse ímpeto não vier das próprias entranhas, guarde para si esse imperfeito simulacro…😉
©️Beatriz Esmer
