Ela não nasceu pronta. Foi se fazendo. Ponto por ponto, linha por linha, como quem borda a própria alma com paciência e coragem.
Se costurou na fé, como quem se ancora no invisível para não se perder no que os olhos veem. Era preciso firmeza para não se afogar nas marés do mundo — e a fé, essa linha invisível, a mantinha à tona.
Se alinhavou no amor próprio, porque já conhecia demais os espinhos do impróprio. Já se prendeu em laços que mais pareciam nós. Aprendeu, então, que o primeiro abraço tem que vir de dentro.
Se enfeitou de sonhos, não por vaidade, mas por sobrevivência. A rotina, com seus dias cinzentos e relógios apressados, já havia tentado desbotá-la. Mas ela, teimosa, bordou estrelas nas segundas-feiras.
Se costurou no perdão — não para esquecer, mas para seguir. Sabia que errar é humano, mas carregar culpa é desumano. E ela queria ser leve.
Com a própria luz, se fez aurora. Não esperava mais o sol nascer lá fora: aprendeu a amanhecer por dentro. E quando a tristeza batia, se agarrava à esperança como quem segura uma agulha fina, mas firme. Doía, sim. Mas doía menos quando havia propósito.
Usou a linha da vida — essa que arrebenta, mas também une — para se abençoar no amanhã. Cada ponto era uma promessa: de que o que viria seria mais inteiro, mais dela.
E com o que sofreu, costurou cicatrizes que hoje são desenhos. Não escondeu. Transformou!
Pelo que ontem morreu, bordou-se hoje sua lembrança. Não como lamento, mas como arte. Porque, no fim, ela entendeu:
se costurou com o que se viveu.
©️ Beatriz Esmer
