O poeta, alma desperta, carrega em si a vastidão do olhar — muito vê. Não só a forma visível das coisas, mas a substância tênue, o secreto mover do mundo. E por ser tamanha a clareza da visão, muito sente, transbordando-lhe a delicada vasilha do peito com o peso e a leveza de tudo.
Desta lida incessante, deste pulsar de espanto e ternura, o espírito cansa. É o fardo da sensibilidade extrema, a lixa sutil que mói a pedra do quotidiano. Mas a exaustão não o silencia; antes, torna-se a fonte de onde a voz se liberta em melodia – e ele canta. Canta a beleza fugidia, a dor calada, o instante que não fica.
E se o canto não basta para conter a maré de dentro, a lágrima verte, sincera e pura, e ele chora…
Num ímpeto de defesa, talvez pela fragilidade que a nudez da palavra impõe, calar tenta. Um frágil desejo de recolhimento, de trancar a porta do sentir para que a vida não o invada de vez. Mas a veia que pulsa é lírica, e a tentativa é breve: pouco demora.
Não se sustenta o dique da mudez, pois a essência é fluxo. A palavra retida é um rio que busca o mar. O peito, ardente, não se aguenta. A substância luminosa, a quintessência do ser, torna-se forma. A Poesia logo escapa.
É força que insiste, semente que rompe a terra. Teima, não foge, aflora… Um milagre da permanência, um destino doce e incorrigível que o veste e o revela.
E o poeta, enfim, se encontra na sílaba que o salva e o condena à eternidade do verso.
©️Beatriz Esmer
