Nestes tempos de uma tristeza grande, quase líquida, que escorre pelas frestas do que somos, o que eu te desejo é, no fundo, apenas o amor…
Desejo-te, sim, esse lugar que não é um lugar: o refúgio do avesso da tempestade. Uma espécie de útero onde o vento, esse uivo primordial, não tenha acesso. Não o barulho em si, mas a sua geometria do desespero. Que ali haja o crepitar, esse ruído vivo da lareira, que não apenas aquece a pele, mas ilumina a poeira suspensa do ar, espantando o frio que se aloja na medula. Mas, sobretudo, quando o mundo se veste desse silêncio branco e espesso da neve—esse véu—eu te desejo algo que é mais que conforto: a substância do amor.
O amor, sim. Essa matéria informe que se faz manto, não para esconder, mas para envolver a nudez essencial, a fragilidade de existir. Um amor que não é um objeto, mas um estado febril, quase um tremor silencioso que se acende nas labaredas e, no entanto, não queima. É um fulgor que incendeia a alma por dentro, o cerne do ser. Um amor que se insinua, se tece, se revela no sussurro calado do floco de neve que cai—a melodia sem som da ternura e da incompreensão mútua.
No miolo da tormenta, na crosta gelada, nessa vertigem de incertezas que nos cerca como um horizonte movediço, eu te suplico o amor que persiste. Não o amor fácil, mas o que é quase um susto de entendimento, uma palavra muda que se reconhece no olhar. Aquele amor que é empatia, que não julga, mas que simplesmente acolhe a desordem. Ele deve ser o ponto fixo, a âncora invisível que flutua. O amor que atravessa os fusos, as ausências, as estações que mudam e, ainda assim, permanece sendo.
Que na crise, na desolação, tu encontres não só o abrigo físico e o calor imediato, mas essa presença inextinguível do amor. Aquele que sustenta o peso, que nutre a semente do que é bom, que levanta o olhar. Eu te desejo o amor. E isso é tudo. Isso é o eterno.
©️ Beatriz Esmer
