A Dor, O Amor e O Tempo

A dor que não se dissolve, a dor que teima em existir,

é um silêncio que, paradoxalmente, ecoa.

Não cala, mas vibra na caverna da alma,

um sussurro com a mesma ternura, veja bem,

de um amor que, por sua vez, se exprime mudo.

É a palavra que a aflição encontra no escuro,

uma promessa jurada com o ardor do eterno.

Ah, Drummond diria: No meio do caminho havia uma dor. E ela não passava.

O Alívio Mínimo

Eis que a Poesia, a muito custo, chega.

Bálsamo distraído, com seus versos macios

a fazer de conta que a ferida sara,

com a mágica pífia, mas necessária, de ritmos e rimas.

Em cada estrofe, o porto, o refúgio,

onde este amor, calejado e tolo, encontra um mínimo de pouso.

Um lenitivo, uma pausa no inventário da melancolia.

Verbos, Outros e A Gente

O Verbo, coitado, atravessa o tempo,

carregando a bagagem de eras — um peso inútil, talvez.

O Tempo, esse sujeito implacável, atravessa o outro,

ligando vidas miúdas num fio que teima em não quebrar.

E o Outro, esse enigma de histórias e afetos,

acaba por atravessar a gente, deixando a marca,

o rascunho de uma vida na carne de outra.

Ninguém se salva sozinho, nem da travessia.

A Festa Inadiável

E nós, neste caminhar torto, nesta trapalhada de existências,

somos o cordel esdrúxulo de prantos e risadas.

Entre o riso que é quase soluço, e o soluço que ainda não é choro,

dançamos o baile insensato da vida.

Celebramos, no susto e na intensidade,

o fado de estar aqui. E de, apesar de tudo, sentir.

©️ Beatriz Esmer

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